sábado, 29 de maio de 2010

Sobre a coragem de ser.

Sempre paro para pensar no que nos faz gente, no que nos identifica como seres humanos, únicos e individuais, em meio a tanta gente, tantos outros seres humanos, que, semelhantes a nós, buscam sua identidade.

Também imagino como a sociedade se organiza a partir daí, destas centenas de milhares de pessoas que buscam ser elas, reconhecidas a partir de si mesmas, com suas necessidades, desejos, objetivos e expectativas de futuro. Todas em busca do seu “lugar ao sol”.

Individualmente, nossa história começa por nossos valores, pelas coisas que acreditamos e nos fazem ver o mundo de uma determinada forma. Igualdade, justiça, honra, fidelidade, companheirismo, solidariedade, compaixão e tantos outros sentimentos/valores que nos medem diariamente, nas situações mais corriqueiras.

Coletivamente, a competição pela sobrevivência tem um papel essencial na organização de nosso dia a dia. Habilidades, prazos, contas, hierarquias, organizações, instituições, recursos financeiros, tecnologias e todos aqueles instrumentos que tornam possível que realizemos nossos objetivos pessoais.

As Ciências Sociais se organizam a partir destas perguntas, creio eu. Cultura, sociedade, economia e política. Um pouco mais atrás, a dar suporte às compreensões, temos a filosofia, que organiza as visões de mundo e, se também o quiserem, em dimensão diferente, a religião.

O fato concreto da vida é que ela acontece estejamos ou não preparados. Nosso destino será tanto melhor quanto mais percebermos os seus mecanismos e buscarmos nossa adaptação a este duplo engajamento, ser eu e estar com o outro.

No fundo, a política, enquanto atividade, é um modo de fazer a organização destes dois mundos, trazendo para a vida coletiva os aspectos gerais de estruturação que tornam possível crescermos coletivamente, em cultura, valores, riquezas e conhecimento. É atividade nobre, portanto, e indispensável.

Mas, se é assim, por que tantos desacreditam da atividade e, principalmente, de quem a pratica? A resposta mais imediata e superficial remete ao modo como muitos políticos organizam suas vidas individuais em torno dos recursos que a política é capaz de prover. Ou seja, sempre imaginamos que quem faz política quer “se dar bem”.

Os hábitos de tratar o que é público como patrimônio privado; de empregar parentes e/ou apenas pessoas dóceis a quem está no poder; e, finalmente, começar tudo de novo a cada novo mandato, abandonando o que se fez de bom anteriormente, fazem parte desta cultura ruim da política, que hoje é tão presente em nosso “preconceito” dos políticos e da vida política de uma maneira geral.

Na realidade, em um mundo democrático, em que a informação circula livremente, estes hábitos terminam por agredir ao senso comum geral do eleitor, distanciando, todos os dias um pouco mais, a vida pública de sua compreensão mais imediata. Políticos então, passam a ser vistos como “pessoas” que só olham para si mesmas, incapazes de resolver os problemas que afligem a maior parte da população.

Se fossemos medir, em termos de minutos de exposição e, também, páginas de jornal e portais de notícias, dificilmente teríamos um tempo tão propício à discussão política. No Piauí, então, são horas de programação local das TVs e centenas de manchetes diárias de jornais e portais. De fora, é quase como se nada existe fora da política.

Este contraste entre expectativas e realidade é hoje uma base forte do cansaço coletivo que se sente em relação à vida política. Fora uns 20% da população que por afinidade, interesse, ou profissão, são obrigados a acompanhar a evolução dos fatos, a esmagadora maioria do eleitorado não observa a política no dia a dia e, metade dele, como se apurou recentemente, se pudesse, sequer votaria.

Como diria Tocqueville, de boa vontade, ao nos entregarmos às nossas vidas privadas, realizamos a tirania na vida pública. Daí nascem os políticos que só defendem seus próprios interesses, de costas à população. Nascem, igualmente, as frustrações, o sentimento de impotência e a frustração coletiva.

Creio que não seja preciso muito para ser político, destes assim comuns, que constroem carreira na incoerência e na força de uma vontade estritamente individual. Mas é preciso coragem para ser político diferente, destes que erguem compromissos e mobilizam pessoas em nome daquilo que é intangível: valores, princípios e crença de que as coisas podem ser de um novo jeito.

Um comentário:

Amanda Viana disse...

Ao contrário do que se vê no jornalismo daqui, existem, sim, outras tantas pautas em nossas vidas, além da Política. Existe até mesmo a pauta dos tais Princípios e Valores, que também, e principalmente, acabam por nortear o cidadão-eleitor.